Física da USP busca encontrar evidências de vida no planeta Marte
Detectar evidências da existência de vida – passada ou presente – no
planeta Marte por meio de futuras missões espaciais é o objetivo do
projeto apresentado pela pesquisadora Maria Fernanda Cerini no Instituto
de Física de São Carlos (IFSC) da USP. A ideia é aproveitar as missões
para tentar encontrar bioassinaturas moleculares, que são rastros ou
vestígios da presença de vida que se apresentam na forma de moléculas.
As moléculas encontradas na exploração de Marte serão analisadas com a
técnica de caracterização espectroscópica, ou seja, por meio da
interação com a luz serão obtidas informações sobre sua composição, as
quais ajudarão a identificar as bioassinaturas.
O projeto Simulações ambientais e caracterização espectroscópica
in situ de potenciais bioassinaturas moleculares para aplicação em
missões espaciais utiliza princípios de astrobiologia. “Os
astrobiólogos estudam a origem dos elementos e a formação das moléculas,
e investigam os mecanismos e condições que levaram ao surgimento da
vida no nosso planeta, considerando diversos fenômenos do Universo,
como, por exemplo, raios cósmicos e radiação estelar, bem como cometas e
asteroides colidindo com a Terra e enriquecendo-a com novas
matérias-primas”, aponta Maria Fernanda. “Este projeto está mais focado
na distribuição da vida no Universo, questionando se houve (ou se ainda
há) vida fora de nosso planeta.”

O primeiro desafio que Maria Fernanda aponta é como procurar essa
vida que, se existiu, deixou rastros – as designadas “bioassinaturas”.
“Bioassinaturas são marcas ou evidências da presença de vida, passada ou
presente, e elas podem se apresentar de diversas formas, como, por
exemplo, através de fósseis, isótopos, moléculas ou até fenômenos”,
afirma a pesquisadora.
O projeto de pesquisa tem como meta a descoberta de evidências
moleculares, ou bioassinaturas moleculares, utilizando caracterização
espectroscópica das mesmas – na qual a interação da luz com a matéria
fornece informações sobre sua natureza. O limite espacial para
desencadear as buscas denominadas in situ (= no lugar) – em
oposição a buscas remotas (feitas com telescópios e satélites) – se
resume aos planetas, cometas e outros corpos celestes que se encontram
no nosso sistema solar, pois requerem o envio de sondas até a superfície
desses corpos. E a escolha recaiu sobre o planeta Marte.
Marte
“Optei por Marte porque, além de ser um dos planetas vizinhos da
Terra, ele tem o potencial de ter abrigado vida e de preservar seus
resquícios”, explica Maria Fernanda. “A intenção de minha pesquisa é
definir quais biomoléculas poderiam ser sinais de vida, auxiliar na
escolha dos equipamentos de uma sonda e do seu local de pouso em Marte,
onde será feita uma série de leituras espectroscópicas buscando as
bioassinaturas.”
Já ocorreram diversas missões espaciais para exploração da superfície
marciana, tanto remotas quanto através de sondas, como, por exemplo, a
Viking, a Pathfinder e hoje a Curiosity. Tais missões já apontaram a
presença de água congelada em sua superfície e evidências de que Marte
já foi mais quente e coberto de oceanos de água líquida, pela presença
de marcas de erosão, como canais e cânions, e de argilas (formadas por
interação de rochas com água).
Tudo isso se conjuga para que, possivelmente, tenha existido vida em Marte, pois acredita-se que essas condições facilitam o surgimento e evolução da vida e a preservação de bioassinaturas.

Contudo, a discussão entre pesquisadores sobre a vida extraterrestre
não é pacífica, já que alguns deles pensam no assunto fora do
entendimento e dos conceitos da vida terrestre, que, como sabemos, é
baseada em química orgânica (moléculas compostas principalmente por
carbono, hidrogênio e oxigênio). “Pode haver vida baseada em silício?” –
questiona Maria Fernanda, que imediatamente argumenta, respondendo à
própria questão: “Pode ser que sim, mas hoje em dia já temos evidências
da existência de moléculas orgânicas espalhadas por todo o lado,
inclusive pelo espaço sideral, como comprovam inúmeras observações
astronômicas. Temos meteoritos que caíram no nosso planeta e eles
continham, por exemplo, aminoácidos”, sublinha a pesquisadora.

Além de pensar em missões espaciais para pouso em Marte, o projeto de
Maria Fernanda Cerini compreende ainda outras formas de dar suporte à
prospecção de vida extraterrestre, como, por exemplo, realizando
experimentos na estratosfera, um ambiente acessível e análogo a Marte
por ter baixas temperaturas, pressões e umidade, e alta taxa de
radiação. Em uma parceria com o Grupo Zenith, da Escola de Engenharia de
São Carlos (EESC/USP), seu grupo de pesquisa envia sondas a bordo de
balões de alta altitude que permitem testar a resistência da vida e de
suas bioassinaturas em ambientes extremos (expondo microrganismos
terrestres e biomoléculas a essas condições). Ela participou dos
projetos Garatéa I e Garatéa II, semelhantes ao projeto mais recente,
Garatéa III, lançado em abril último.
Além disso, uma grande perspectiva da pesquisadora é lançar seus
experimentos no espaço profundo, a bordo dos chamados “CubeSats” –
pequenos satélites com forma de cubos de 10 centímetros –, para a mesma
finalidade.
Maria Fernanda Cerini tem 26 anos, fez graduação em Química na Universidade de Campinas (Unicamp), realizou um intercâmbio acadêmico no Reino Unido e fez seu mestrado em Física Biomolecular no IFSC, no âmbito do projeto de pesquisa em Astrobiologia no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS).
Rui Sintra / Assessoria de Comunicação do IFSC
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